Toda virada de ano é uma oportunidade para intencionar deixar para trás algum aspecto da vida que está sendo danoso para si mesmo, para os outros ou para o mundo. Quem não quer se liberar de pesos, limitações ou desequilíbrios?
Em geral, as pessoas que buscam terapia ou trabalhos de autoconhecimento, o fazem porque sentem que algo não vai bem ou poderia ir melhor em suas vidas. Tenho aprendido que para tomarmos coragem de ir mais fundo e revisar as nossas escolhas e a nossa própria história, é necessário estar em contato com a dor, os traumas, as dificuldades, os medos, os vícios, os desequilíbrios ou as vulnerabilidades. Enquanto uma pessoa está anestesiada de si ou de partes suas, dificilmente ela consegue buscar um caminho mais genuíno, constante e profundo de crescimento interior.
É muito comum no meu trabalho como terapeuta, eu escutar que há presente o desejo de se libertar de padrões, de amarras, de encontrar novos caminhos ou formas mais livres de estar no mundo. Afinal, é para isso que as pessoas buscam terapia, para encontrar apoio e acompanhamento para lidar com os aspectos mais vulneráveis da vida.
O grande ponto é que, muitas vezes, queremos liberação, cura, uma nova forma de caminhar, mas no fundo, queremos que vá embora somente o difícil e o ruim e que permaneça o conforto, o conhecido, o seguro... E, infelizmente, isso não é possível.
Tenho aprendido com o estudo das Constelações Familiares e da Gestalt Terapia que nada permanece em nossa vida se, em algum nível, não estamos ganhando algo com isso. Às vezes essa vantagem é muito pequena a olhos nus, mas enorme e fundamental para a criança acuada e ferida que vive em nós. De modo que para que o desejo de liberação encontre profundidade e você possa entrar num caminho real de crescimento, é necessário investigar não apenas o que está limitado, difícil, doentio ou ruim, mas também entender o que você vem ganhando para sustentar esse padrão.
Compreender o ganho secundário é fundamental para que seja possível entender qual o ritmo e direção que você pode dar para o seu processo de crescimento a cada momento. Pois o que acontece, com frequência, é que quando se chega nesse ponto de fazer contato com a vantagem secundária que há em cada padrão doentio, surge o impulso de sair correndo e interromper o processo e as intenções iniciais de cura. Isso acontece porque começamos a lidar com camadas inconscientes e estruturais onde parece nos custar muito caro adentrar e mexer.
Estamos aqui falando das nossas couraças mais básicas e profundas e daquilo que em nós teme não ser capaz de sobreviver sem aquelas dinâmicas. Esse é um ponto delicado de dor e resistência, um verdadeiro gargalo afunilado de difícil passagem na trajetória de desenvolvimento do ser, que merece ser cuidado e contemplado com muita atenção.
Como boa pisciana, tenho afinidade com muitas técnicas terapêuticas de cura quântica e energética, com experiências transcendentais, de expansão da consciência e ativação da sensibilidade. Recorro a elas, trabalho com algumas e todas que já conheci tem seu valor e reconhecimento no meu caminho. Mas com o tempo, venho me dando conta de que sem um enraizamento para olhar e aprofundar na própria história de vida e da dor humana manifestada em si a partir dessa história, todos esses processos de cura e de autoconhecimento ficam muito limitados a compreensões etéreas que apesar de surtirem algum efeito num primeiro momento, se enfraquecem com o passar do tempo.
Uma vez uma professora me ensinou que técnicas de limpeza, cura e proteção são maravilhosas para aprendermos a conhecer a nossa energia e a nos liberar do que não é nosso. Mas que esse é só o primeiro passo no caminho. Se não adentrarmos na nossa própria história e mundo interior para travarmos o doloroso contato com o que nos atrela a dinâmicas e situações, aquilo que foi “limpo” ou “curado” voltará. Não por castigo, mas por necessidade que não se fuja do trabalho que precisa ser feito nas nossas trajetórias individuais, sistêmicas e coletivas.
Desejo que nesse início de ano, possamos, em primeiro lugar, ganhar honestidade consigo mesmo e compreender qual o passo que nos cabe dar nesse momento presente. Muitas vezes, menos é mais. Intenções simples e sinceras podem abrir portais nunca antes imaginados, enquanto grandes ambições de cura e iluminação criam véus e mais véus que nos afastam de nós. Muitas vezes, mas não sempre. Porque a estrada de cada um é muito peculiar e ainda que todas levem ao mesmo lugar, só você pode de verdade saber qual é a sua. Um feliz Ano Novo para nós!
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